Glauco de Arruda
Se estiver à morte, só pretendo
tomar tal consciência quando os sinais forem suficientemente visíveis.
Não pretendo, de forma alguma,
tentar retardar ou arrogantemente alterar os planos da senhora das mortalhas.
Àqueles que me são caros e que
espero também assim me considerem, peço que não lancem mão de seus bens
materiais, para tentar alterar o rumo do inevitável. Não comprometam suas
existências terrenas, seja por amor ou piedade, a fim de postergar um
compromisso agendado e certo.
Creio ter tido o tempo necessário
de existência e os recursos justos para realizar as coisas que me eram devidas.
Caso não tenha alcançado algum objetivo, que eu mesmo tenha determinado ou não
tenha feito coisas que em minha fértil mente porventura tivesse imaginado, não
terá sido culpa do mundo, de outrem ou de falta de tempo. Maktub, diriam alguns
médio-orientais.
Se não escrevi tudo e tanto quanto
teria ou deveria ter escrito, talvez seja porque me perdi em meandros outros se
não aqueles das letras, da filosofia, da literatura. E se percorri caminhos
diversos daqueles que me indicavam os dons naturais, foi exercendo a máxima do
livre arbítrio. Não posso me queixar dos resultados. Até que me foram
favoráveis.
A maturidade, finalmente, serviu
para me ensinar que confortos materiais, assim como tudo – situações, momentos,
relações, atividades – são efêmeros. Acho que finalmente aprendi.
Peço, ainda, que não chorem por
minha iminente partida, tampouco quando a mesma se concretizar. Solicito, no
entanto, caso não seja pedir demais, que durante o tempo, após minha partida,
em que eu ainda possa estar conservado como uma lembrança – porque essa
condição também é efêmera – que leiam alguns dos poucos escritos que eu tenha
deixado. Uma postagem nos infomeios; um trecho de um conto; uma crônica; uma
poesia. Fazendo assim, caso exista consciência após a passagem desta vida,
saibam tantos quanto o fizerem, deixar-me-ão feliz.
Em verdade, apesar de reconhecer
não ter feito muito esforço para tal, ser lido sempre foi meu grande desejo
nesta vida, mesmo que apenas por um tempo ou por um número limitado de pessoas.
Mas acreditem, cada palavra que eu tenha lançado ao papel, sempre que lida por
alguém, renovou em mim, ao longo da vida, a esperança de cumprir minha missão
terrena.
Não sei se ora porto algum mal
físico, que esteja me colocando diante dos últimos quilômetros ou metros do
traçado desta vida, mas espero que esse pedaço que falta para caminhar possa me
trazer o mínimo de dignidade ao espírito. Não me preocupo com o leito de um
hospital público, mesmo que seja aqui nesta terra brasilis, com a pouca
atenção de médicos ou enfermeiros, quando estiver próximo do desacordar. Oro,
apenas, para que não sejam muitos os últimos suspiros e que a dor, caso esteja
presente, seja plenamente suportável. De resto, a eternidade ou a inexistência
eterna. Seja qual for, bem vinda!
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